segunda-feira, 11 de janeiro de 2021

FOLKLORE: O Escapismo de Lagos, Isolamento e Narrativas


(Photoshoot do Álbum por Beth Garrabrant)

            Folklore é o oitavo álbum de estúdio lançado por Taylor Swift, cantora americana que já ganhou anteriormente dois Album Of The Year no Grammy 's (em 2010 por “Fearless” e 2015 por “1989”). O trabalho fez muito sucesso mundialmente este ano, sendo a maior estreia de um álbum feminino de todos os tempos no Spotify, maior plataforma musical do mundo, e levando a cantora a concorrer ao seu terceiro álbum do ano. Juntamente com ela, houve produção de dois de seus amigos, Jack Antonoff e Aaron Dessner. Diferente de seus trabalhos anteriores que focavam em sua vida pessoal e experiências amorosas, Swift decidiu criar narrativas sobre o que ouvia de pessoas da sua família, de casas onde já morou ou criar personagens para contar suas histórias e criar seu próprio folclore. Segundo ela, as músicas nasceram de uma tentativa escapista durante a quarentena causada pelo Covid-19, deixando sua criatividade solta e se amalgamar com fantasias, histórias e memórias.

            Para um trabalho que foi lançado em um dos 24 de julho mais conturbados de todos os tempos, em pleno isolamento social e pessoas se encontrando apenas virtualmente, começar com a frase “Eu estou bem, estou tentando coisas novas / Estive dizendo sim em vez de não” nos deixa mais próximos da história ali contada. A narrativa mais interessante fica por conta de uma trilogia das músicas Cardigan, August e Betty. A história se inicia quando, em Cardigan, conhecemos Betty, uma mulher que devaneia sobre um acontecimento da adolescência, quando seu namorado da época acaba trocando-a por outra garota chamada Augustine nas férias de verão. A partir da melancolia do sentimento de lembrança, Betty diz “Eu sabia que você / Tentou mudar o final / Peter perdendo Wendy, eu / Eu te conhecia / Indo embora como um pai / Correndo como água, eu / E quando você é jovem, eles deduzem que você não sabe nada”. A história continua e volta ao tempo para que conheçamos a perspectiva de Augustine na faixa “August”. Ali descobrimos que, depois das férias de verão, James volta para Betty e deixa Augustine. O intrigante aqui se torna o eu lírico da personagem nos ganhar por sentirmos que ela estava apaixonada pelo rapaz e acreditava que ele deixaria a namorada para ficar com ela. Trechos como “Mas eu consigo nos ver perdidos nas memórias / Agosto foi embora em um instante de tempo / Porque isso nunca foi meu / E eu consigo nos ver enrolados em lençóis / Agosto foi embora como um gole de uma garrafa de vinho / Porque você nunca foi meu” demonstram isso. Para finalizar o ciclo, temos a perspectiva de James, na qual conseguimos perceber uma crítica da cantora. Enquanto as duas faixas anteriores são escritas e compostas por melodias bem trabalhadas e letras elaboradas e com referências, Betty é simplista e repetitiva, fazendo pensar no rapaz como um homem qualquer que tenhamos visto tentando se desculpar por ter traído. A ligação final do triângulo amoroso fica pelo refrão “Mas se eu aparecesse na sua festa / Você me receberia? / Você iria me querer? /Você me diria para ir para o inferno? / Ou me levaria ao jardim? / No jardim você confiaria em mim / Se eu te dissesse que foi apenas uma coisa de verão? / Tenho apenas dezessete anos, não sei de nada / Mas eu sei que sinto sua falta.”.



            Todas as dezesseis músicas que foram escolhidas para o trabalho possuem narrativas mirabolantes e que deixam o ouvinte atento até o último segundo. Epiphany, uma das minhas favoritas, faz um paralelo entre os médicos nos hospitais durante a pandemia e os soldados da Segunda Guerra Mundial. The Last Great American Dynasty tenta relatar o machismo contra uma cantora dos anos 50 chamada Rebekah Harkness, conhecida por sua vida de luxo e festas extravagantes. Seven tem uma bela história de amizade onde uma criança descobre que seu vizinho sofre homofobia de seu pai e chama-o para fugir para Indiana e viver como piratas. O conjunto torna-se coeso e leve, mesmo tratando de histórias cheias de emoção, ao explorar o gênero Folk deixando tudo mais leve e calmo.

            O álbum me remeteu aos “Lake Poets”. Era, basicamente, poetas do romantismo, como William Wordsworth e Beatrix Potter, que viviam em um “Distrito dos lagos”, na Inglaterra da metade do século XIX. Esses escritores escolheram morar à margem desses lagos, em uma espécie de vila, para que sua criatividade aflorasse e conseguissem escapar da sociedade para seguir a “Escola” que Wordsworth estava criando. Sendo suas principais características a linguagem e o eu lírico simples, escrita com exaltação da natureza e, a mais importante, voltar-se para dentro de sua mente, produzindo uma visão semi autobiográfica da natureza e da imaginação. O álbum faz diversas referências a esse modo de escrita, principalmente em “The Lakes”, que possui todos esses adereços, além de citar diretamente o movimento e a beleza dos picos de Windermere.

(Taylor Swift durante gravação de seu álbum - 2020)

            Por fim, Taylor Swift cria um trabalho que possui semelhanças com narrativas literárias, trazendo até referências de histórias clássicas e autores. Durante o isolamento social, todos nós buscamos alguma forma de fugir da realidade pelo menos uma vez ao dia, seja uma série, livro ou filme. Dentro de cada uma dessas músicas encontramos pequenos contos em forma de músicas, mundos e perspectivas que, muitas vezes, não tínhamos parado para observar. Essa obra pode ser indicada para qualquer um que queira encontrar, como a Taylor ou os poetas que escreviam à beira dos lagos, um refúgio inspirador esperando que tenhamos verões melhores novamente.





13 comentários:

  1. Belo texto! Folklore um cd muito bem feito que veio para entreter um ano tão conturbado como 2020 foi.

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  2. Que texto incrível! Abraça a contemporaneidade de Taylor Swift envolvendo seu background mais antigo. Simplesmente perfeito

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  3. Texto incrível. Expressa perfeitamente o sentimento que o folklore transmite.

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  4. Texto incrível do início até o fim, a forma majestosa e atenciosa como exalta o álbum demonstra sua paixão íntegra pelas canções, explendido

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  5. Álbum absolutamente icônico, o melhor de 2020!

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  6. Ótimo texto! Capturou bem o espírito do álbum. 👏🏽

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  7. Muito bom mesmo, sem falar o feat. perfeito com Bon iver em "exile".

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  8. Texto perfeito! Captura basicamente tudo que o folklore representa!

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  9. Ficou incrível,me trouxe exatamente o que álbum me passou enquanto eu como simples ouvinte aproveitava cada nota. Parabéns!

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