Mais um dia monótono se encerrava para Antonieta. Após acordar bem cedo, ir à aula pela manhã, estudar sozinha à tarde e trabalhar à noite, agora ela se encontrava no ônibus, finalmente a caminho de casa, na companhia de Carmélia, amiga de longo prazo com quem Antonieta recentemente passara a dividir os aposentos.
- Nita! Nita! - Carmélia chama Antonieta de maneira exaltada, sem perceber que a amiga está quase caindo no sono ao seu lado.
- Diga - responde Antonieta após um longo bocejo.
- Olhe aquele cara ali! Olhe como ele é lindo! Olhe como ele combina comigo! Aposto que ele gosta das mesmas bandas que eu! Dos mesmos seriados que eu!
- Mélia, você disse a mesma coisa hoje sobre um outro desconhecido enquanto almoçávamos...
- Mas, Nita, dessa vez é verdade! Ele é o homem da minha vida!
Qualquer outra pessoa se irritaria com a frequência com que Carmélia encontra amores de sua vida, mas Antonieta já estava acostumada. Desde a infância, a amiga se apaixonava cerca de três vezes ao dia.
- Nita, você ainda não olhou pro meu futuro marido! Olhe, olhe, olhe!
- Carmélia, você nem conhece o mapa astral dele! Nem ao menos sabe o nome! Imagina se ele tem sol em capricórnio! Ou pior, vênus em câncer!
- Nita, a viciada em astrologia aqui é você! - disse Carmélia entre risadas.
- Tudo bem, mas e se ele tiver chulé? Ou pior, se ele tiver mal hálito! Você nem conhece os gostos dele, as manias...
Antonieta sabia que todos esses argumentos eram ignorados por Carmélia: havia usado os mesmos diversas vezes, até desistir de provar para a amiga que era impossível amar alguém assim, à primeira vista. Agora, ela estava apenas se divertindo às custas da outra, que explicava que poderia concertar os defeitos do homem da sua vida, que existem produtos para acabar com o chulé, e chicletes para disfarçar mal hálito. Antonieta apenas sorria.
- É o nosso ponto, Mélia. - As portas do ônibus se abriram e as amigas desceram, Carmélia sendo puxada pelo braço, olhando para trás buscando ver por um último momento aquele que fora aproximadamente sua centésima paixão platônica do mês, e Antonieta sorrindo, sabendo que a cena iria se repetir no dia seguinte, e no seguinte, e no seguinte... - Não fique triste Carmélia, você vai superá-lo, podemos ver filmes tristes e comer chocolate hoje à noite! - Seguiram para casa abraçadas.
"Ah, Carmélia, sorte sua se desapaixonar com a mesma facilidade que se apaixona! Mal sabes o quanto é duro seguir amando alguém que já estragou tudo, ou pior, alguém com quem seu mapa astral não combina..." - refletiu Antonieta segundos antes de perceber que Carmélia estava chacoalhando-a daquele jeito de sempre, aquele jeito de quando a amiga acaba de encontrar, mais uma vez, o amor da sua vida.
Autoras: Giovana Andrade e Renata Servato
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