Bertolt Brecht |
O drama como crítica em Teatro dialético, de Bertolt Brecht
O que apenas imita, que nada tem a dizer
Sobre aquilo que imitia, semelha
Um pobre chimpanzé que imita seu treinador fumando
E nisso não fuma. Pois nunca
A imitação irrefletida
Será uma verdadeira imitação.
Bertolt Brecht
Bertolt Brecht (1898-1956)
foi um importante dramaturgo, teórico, poeta, músico e ensaísta alemão do
século XX. Ao final da década de 1920, Brecht desenvolveu o teatro épico, que
foi um dos movimentos de emancipação do teatro moderno em relação às normas do
teatro tradicional. O teatro épico surgiu não apenas com o objetivo de romper
com as normas do drama tradicional, o seu maior objetivo foi utilizar o teatro
como um instrumento didático, uma forma de esclarecimento ao público sobre as
necessidades de transformação da sociedade.
Um dos fundamentos do gênero
épico é a narrativa. Foi com esse elemento que Brecht complementou a cena,
utilizando várias de suas formas, evidentes ou não, como a música, o coro,
canções, cartazes, projeções de filmes e outros artifícios narrativos com
função de interrupção da ação. Esses elementos causam o Efeito de
distanciamento, conceito central do teatro épico de Brecht: a cena é
interrompida com o intuito de levar ao público, de forma crítica, os
acontecimentos e comportamentos das personagens. O ponto fundamental do Efeito
de distanciamento é a manutenção da consciência da audiência acerca do caráter
de ilusão da representação, tanto da cena quanto da atuação. O ator rejeita a
transformação total na personagem que representa, mantendo-se como um
intermediário entre o texto e a plateia. Preferencialmente, não representa o
fato por meio da ação, mas o narra como testemunha do acontecido, Brecht (p.
142), neste ponto, substitui o termo “ator” por “demonstrador”. A cena deve
permitir que elementos técnicos, como as fontes de luz e contrarregras que
introduzem e retiram objetos da cena, antes fora do campo de visão do
espectador, surjam no palco, o que evita a ilusão indesejável.
Com o Efeito de
distanciamento a plateia não fica à mercê das eficientes técnicas cenográficas,
da atuação e, consequentemente, da empatia, elemento que trabalha no
subconsciente e que faz a audiência se identificar tão fortemente com as
personagens a ponto de perder seu senso crítico. O Efeito de distanciamento não
pretende excluir completamente a emoção, defende Brecht, mas direciona as
emoções do público a um nível em que não precisam corresponder integralmente às
das personagens representadas. A música é também um dos elementos cênicos que,
em Brecht, contribui com o rompimento da magia do teatro tradicional. Para o
dramaturgo, a música deve ter um objetivo didático e crítico, deve ser Música-Gestus.
Segundo Brecht, Gestus
não significa somente gesticulação, “movimentos das mãos, explicativos ou
enfáticos” (p. 77); o Gestus se dilata ao comportamento e a interação do
homem social. Para Brecht, uma linguagem só será Gestus se baseada em um
gesto adequado às atitudes particulares que um indivíduo ou uma coletividade
adota em relação a outros homens. O exemplo dado por Brecht auxilia a
compreensão: “arranca o olho que te incomoda” / “se teu olho te incomoda,
arranca-o”. A segunda frase, afirma o teórico, é Gestus pelo fato de não
se apresentar como exigência ou ordem (a primeira frase assim o faz); é Gestus
por proporcionar um suposto “se” e por encerrar-se com uma surpresa
(“arranca-o”) que é, ao mesmo tempo, “um conselho libertador” (p. 77-78). Está,
nestes dois elementos citados, um Gestus social, uma tomada de posição
política: perceber o outro homem, dando a ele, seu interlocutor, a chance de
analisar e refletir sobre sua situação e sobre a sugestão oferecida. No teatro
épico, os atores voltam-se para o público apresentando suas “sensações individuais”
em músicas reflexivas e de caráter ético. Para isso, é preciso que haja nas
músicas diferentes Gestus, como: “polidez ou fúria, humildade ou
desprezo, concordância ou dúvida” (p. 80), induzido, assim, o espectador a
refletir sobre o comportamento humano de um ponto de vista social, dando a ele
o poder da crítica e o poder do julgamento.
Dessa forma, é possível
perceber que, no teatro épico brechtiano, o que se pretende é “elevar a emoção
ao raciocínio”, como afirma Anatol Rosenfeld (p. 32), e, também, instigar o
pensamento crítico do público sobre questões políticas e sociais. A abordagem
de Brecht sobre o papel e as formas do drama nos dão indícios do poder
transformador social do teatro, o que nos remete à reflexão sobre o papel da
arte na sociedade. A arte carrega em si a história da humanidade; nela, os
homens compartilham não apenas suas ideologias e visões de mundo, mas também críticas
e análises de suas percepções acerca da vida. A arte tem caráter formador, seja
como instrumento de alienação ou gerador de seres críticos e pensantes.
Hellen Lopes de Carvalho, graduanda de Letras-Espanhol na Universidade Federal de Goiás - UFG
Referências bibliográficas:
BRECHT, Bertolt. Teatro
dialético. Trad. Luiz Carlos Maciel e Sérgio Micelli. Rio de Janeiro:
Civilização Brasileira, 1967.
______. Sobre a imitação. In:______. Poemas
1913-1956. Trad. Paulo César de Souza. São Paulo: Editora 34, 2012. p. 239.
ROSENFELD,
Anatol. Brecht e o teatro épico. São Paulo: Perspectiva, 2012.
Gostei muito do seu artigo sobre Brecht.
ResponderExcluirSou fã de teatro e curto informações do genero.
Parabéns!