sexta-feira, 22 de julho de 2016

Crônica - "Sabe com quem tá falando?", Mateus Soares Dias

Sabe com quem tá falando?
Quinta-feira à noite, esperava na fila do supermercado. A noite estava quente e parada. A mulher do caixa passava os produtos calmamente. Muito calmamente... Me distraía com milhares de coisas. Meus pensamentos passeavam pelo ia fazer amanhã, pelo estranho e infeliz anúncio de “Amostra grátis de papel higiênico” e a possível decapitação das irritantes que não param de correr e gritar. Nossa como estava quente! O suor deslizava sobre minha pele como se tivesse preguiça e não via a hora de sair de lá.
Na minha frente, havia um casal com uma felicidade insuportável de começo de namoro, um homem de cabelos grisalhos, calmo e de boa postura. Uma mãe, um tanto cansada, com seus filhos. Eu só conseguia pensar se ia demorar muito tempo. Afinal tinha que chegar em casa e escrever a tal da crônica. No entanto, a caixa passava os produtos com uma lentidão análoga das lesmas. Cada segundo era eterno. Tentava pensar em qualquer assunto para escrever. Nada surgia. Nenhuma ideia.
Enfim, o casal feliz passou tudo que tinha para passar. Era vez do senhor de cabelos grisalhos. Contudo, uma jovem de uns vinte e poucos anos furou a fila e disse com uma feição terna que seria rapidinho.
Moça, estou esperando muito tempo e você entra na frente? Não pode, não!”, disse o homem de modo tranquilo, mas reagindo a falta de respeito.
Eu sei, senhor! É que são poucos produtos. Estou com pressa!”, disse a moça de vinte e poucos anos mostrando a sacola.
Isso não é só injusto comigo, mas com todos que entraram e esperam na fila.”, disse o senhor com convicção. Nessa hora a mãe de dois filhos assentia com a cabeça para confirmar e eu até então perdido nos meus pensamentos comecei a prestar atenção nessa situação insólita.
Tinha que ser um velho chato desses. Eu já disse que são poucas coisas.”, disse a moça alterando o tom de voz.
Olha aqui, moça! Você quer passar? Entre na fila e espere como todo mundo”, disse o senhor.
Tá tão velho que nem me escuta! São poucas coisas! O que custa?”, reforçou a moça quase gritando.
Você é muito mal-educada, devia ter o mínimo de respeito por essas regras básicas”, disse o senhor um pouco mais nervoso.
Querido, você sabe com quem tá falando?”, disse a moça já bastante nervosa.
Não!”, disse o homem.
O meu pai é sujeito muito importante então coloque-se no seu lugar, tá bom?”, disse a moça petulantemente.
Ah é?, perguntou o homem.
É sim.”, confirmou a moça.
Que bom! Eu sou delegado e você está presa!”, arrematou o homem.
A mulher ficou pasma e pálida e sem qualquer tipo de reação enquanto o delegado retirava as algemas de seu bolso. Em uma tentativa desesperada de obter perdão, ela dizia que não era sempre assim e que poderiam resolver isso de outra forma. O homem de cabelos grisalhos manteve sua postura resoluta e conduziu a moça para saída.
Eu não conseguia entender muito bem o que estava acontecendo, mas ria por dentro. Jamais pensei que alguém pudesse ser preso por furar fila. Pensava também, qual a justificativa da prisão. Roubo de lugar da fila? Muito absurdo. Maus tratos a pessoas de idade? Teriam que prender muita gente. Desacato a autoridade? Parece mais plausível.
Depois da saída do delegado. Trocaram a mulher que atendia o caixa. Acredita? Essa era muito mais rápida. Passou os produtos da mãe rapidamente. E enfim os meus. Voltei para o carro e pensei:
Quem sabe? Talvez dê uma boa crônica.”

Estudante: Mateus Soares Dias
Letras: Português/ licenciatura - UFG

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